Maternidade negra e carreira: desafios e perspectivas

Conciliar maternidade e carreira é um desafio para muitas mulheres. Para mulheres negras, mais ainda. A construção de uma sociedade mais equânime, que respeite o direito de ser mãe, passa pelo letramento das lideranças sobre parentalidade e racismo no mundo corporativo. Trata-se de um processo que envolve homens e mulheres, pretos e não pretos, em uma tomada de consciência para novas ações.

Maternidade negra e carreira: Combatendo os Ruídos

Durante a live de lançamento do e-book  “Maternidade e Carreira: Combatendo os Ruídos”, foram colocadas em xeque frases tantas vezes repetidas no mercado de trabalho que já são consideradas “verdades”, mas são mitos que só aumentam as desigualdades de gênero.

Promovida por Luciana Cattony e Susana Sefidvash Zaman, fundadoras da consultoria Maternidade nas Empresas, a live também teve a presença de Lincoln Tavares de Melo (Ele/Dele-He/His), Viviana Santiago, Margareth Goldenberg e Viviane Elias Moreira. O encontro foi uma oportunidade de aprofundar a reflexão sobre um marcador que aumenta a complexidade do exercício equilibrado da maternidade com o trabalho: o preconceito racial.

– Quando falamos de mulheres que lutaram pelo direito de trabalhar, estamos fazendo uso da luta histórica e profundamente necessária de um grupo de mulheres, mas não de sua totalidade. As mulheres pobres sempre trabalharam. As mulheres negras já chegam neste país trabalhando. E em uma condição de exploração – contextualizou Viviana Santiago.

A fala de Viviana ajuda a explicar a experiência de outra participante da conversa. Uma das raras mulheres negras a ocupar uma posição executiva em startups no Brasil, Viviane Elias Moreira relatou que só se deu conta da construção da sua carreira aos 32 anos, após passar por três multinacionais.

– Só fui notar que eu tinha uma carreira quando alguém me perguntou como eu a havia construído. Parei e refleti “eu não construí uma carreira, eu apenas sobrevivi até aqui” – contou Viviane. – O primeiro desafio é validar que temos uma carreira. Mulheres negras executivas são geralmente a primeira ou segunda linha da família que conseguiu cursar faculdade, muitas oriundas de lei de cotas – complementou.

Imagens de controle e estereótipos VS  Maternidade negra e carreira

Viviana Santiago trouxe para o contexto brasileiro a reflexão da socióloga americana Patricia Hill Collins a respeito das “imagens de controle”, estereótipos difundidos em sociedade para rotular mulheres negras. Entre os mais conhecidos, estão a Mammy, representada por uma figura acolhedora e serviçal, desprovida de questões pessoais, a exemplo da governanta escravizada do filme E o Vento Levou; a Jezebel, apresentada como uma ameaçadora meretriz, sedutora inescrupulosa; e a Sapphire, retratada como uma mulher ressentida, raivosa e incapaz, dependente de programas governamentais,

– Conseguimos fazer uma tradução dessas mulheres para nossa realidade local. A grande Mammy, um pouco tola, medrosa e ingênua, nos faz pensar na Tia Nastácia. As Globelezas seriam nossas Jezebels, com seu corpo sendo sempre questionado, afinal todo mundo quer controlar o corpo das mulheres negras. E as mães do bolsa-família são as Sapphires para nosso contexto – comparou Viviana.

Crédito foto: Eye for Ebony on Unsplash

Viviana Santiago explicou que os as microagressões racistas e as imagens de controle sobre mulheres negras são continuamente acionadas no mercado de trabalho, atualizando uma condição de exploração herdada do passado escravocrata. Esses mecanismos são ainda potencializados no espaço da maternidade, no qual muitas vezes as boas profissionais são julgadas como mães perversas, que não oferecem cuidado aos filhos e filhas.

– Quando uma mãe negra solicita seu espaço de cuidado, para levar o filho ou a filha ao médico, por exemplo, as pessoas geralmente têm pouquíssima disponibilidade. É quase como se essa criança negra tivesse menos valor do que uma criança branca. E a gente sabe que, na sociedade brasileira, em função do racismo, as crianças negras são vistas como de menor valor – afirmou Viviana.

Viviane Elias Moreira reconheceu os desafios e sugeriu que a transformação do contexto passa pela aliança entre mulheres pretas, não pretas e homens:

– Precisamos trazer os homens para o centro dessa conversa. Eles precisam entender que essa ponte não será relevante apenas quando tiverem filhas mulheres ou noras. É um fato que precisa acontecer previamente, estruturalmente. Quem está na posição de tomar decisões precisa se conscientizar. E o feminismo branco também deve entender que há uma interseccionalidade muito pesada sobre as mulheres que têm uma carreira.

O papel dos homens na promoção de mudanças:

Lincoln Tavares também destacou a importância dos homens tomarem consciência do seu papel para promover ações e mudanças:

– O letramento para os homens envolve a escuta atenta às mulheres. Nós, homens, somos criados para sermos ouvidos, não para ouvir. É preciso quebrar esse funcionamento. Isso é importante para compreender por que os ruídos em relação à maternidade se manifestam tanto e qual é o papel dos homens nessa transformação.

Margareth Goldenberg pontuou que muitas empresas têm transformado suas práticas para  melhor acolher a parentalidade, conscientes da importância estratégica em reter mulheres entre os colaboradores:

– A maternidade precisar ser vista como impulso, não como obstáculo. As mulheres mães desenvolvem muito mais produtividade e trazem para as empresas habilidades como liderança e priorização de tarefas. Empresas que têm clareza do quanto é importante a retenção dessas mulheres têm desenvolvido uma parentalidade na prática, ou seja, uma ambiência pró-família. Para isso, é preciso ter uma sintonia e uma atuação conjunta entre ações afirmativas, políticas, processos e cultura.

Tomar consciência dos ruídos que atravessam maternidade e carreira é um desafio que precisa ser encarado pelo mundo corporativo. É a partir da informação e do diálogo que as empresas poderão agir de modo seguro e adequado para promover um ambiente mais equânime e humanizado. Com esse objetivo, Maternidade Nas Empresas oferece o letramento para lideranças sob o viés da maternidade e acaba de lançar o e-book “Maternidade e Carreira: Combatendo os Ruídos”. O livro digital é gratuito e pode ser baixado aqui. Boa leitura:

Clique aqui para conversar com a gente!

Para ler uma versão exclusiva desse artigo, publicada no Linkedin, clique aqui.


Sobre a Maternidade nas Empresas

Trabalhamos desde 2017 para o fortalecimento da equidade de gênero e a valorização da parentalidade no universo corporativo. O conceito de nossa metodologia nasce de um núcleo integrado de conhecimentos: Equidade de Gênero + Parentalidade no Trabalho + Employee Experience + Dilemma-Driven Design.

Quer gerar impacto positivo nas pessoas do time, suas famílias e, obviamente, nos resultados do negócio? Entre em contato com a gente!

Pesquisar

Categorias

Posts recentes

Tags

Ainda não há conteúdo para mostrar aqui.